OPINIÃO

Dia Europeu dos Direitos dos Doentes: Os direitos do cidadão vivem uma oportunidade de crescimento e de capacitação

Por: António Carneiro, coordenador do Núcleo de Estudos de Bioética da SPMI

terça-feira, 20 Abril 2021 12:03

No âmbito do Dia Europeu dos Direitos dos Doentes, assinalado a 18 de Abril, fique a conhecer a opinião de António Carneiro, coordenador do Núcleo de Estudos de Bioética da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI), sobre os direitos dos cidadãos doentes em cenário de pandemia.

Em poucos momentos da história recente tivemos noção tão clara de como é importante que o cidadão seja parte ativa na preservação da sua saúde e na corresponsabilização no tratamento da doença. A pandemia pelo SARS CoV-2 (COVID-19) destapou realidades escondidas e tornou claro que ninguém está livre de contrair “uma gripe agressiva altamente infeciosa e com mutações sucessivas” e com mortalidade significativa. A resposta do sistema de saúde, com particular relevo para o SNS foi determinante para o controlo da pandemia, apesar dos percalços de percurso. Ficou claro que só com um serviço de saúde forte e dotado de recursos se pode consagrar o direito do cidadão a preservar a sua saúde e a ser socorrido em caso de doença. 

Num segundo plano a tecnologia desenvolve vacinas em tempo record e com eficácia comprovada. A ciência fez (e continuará a fazer) progressos notáveis no tratamento de novas e velhas doenças. Contudo, os custos implicados condicionam o acesso à inovação, aos tratamentos e às patentes, por vezes, como constrangimentos sufocantes. Os mais velhos, os portadores de multimorbilidade e os cidadãos de menores recursos, são os mais desvalidos e que mais se confrontam com a insuficiência de recursos para se cuidarem e tratarem. Só uma estratégia solidária e de corresponsabilização de todos pode minimizar essas desigualdades.

A experiência da pandemia nos lares e setor social, que se mantinham à parte do sistema de saúde, tornaram claro que as condicionantes sociais, a integração de cuidados e o acesso aos serviços de saúde são necessidades básicas na preservação da saúde e no combate à doença. O envelhecimento, a multimorbilidade, a doença complexa e a perda de faculdades para assegurar o auto-cuidado, não são correspondidas em hospitais, se não existir infraestrutura local e autárquica capaz de assegurar o acompanhamento e suporte. Também aqui aprendemos a lidar com as nossas especificidades e diversidade, compreendendo que o setor social e a saúde são facetas do mesmo poliedro. O acesso a unidades locais de saúde empenhadas e capazes de assumir a responsabilidade pelos seus utentes, são direitos básicos e essenciais quando coordenados com uma saúde pública interveniente, preventiva, integradora e capaz de informar e formar o cidadão. 

A crescente digitalização da prestação de cuidados, da comunicação entre cidadãos, do acesso à informação e do crescendo de registos clínicos eletrónicos, mudaram radicalmente a relação entre profissionais de saúde e cidadãos. São o maior e mais promissor desafio ao modelo de organização dos serviços de saúde. Os direitos do cidadão vivem uma oportunidade de crescimento e de capacitação da pessoa como nunca havia acontecido, mas ao mesmo tempo são ameaçados por inúmeras possibilidades de violação da privacidade e desigualdade de acesso para os info-excluídos.

Se a Europa aprofundar a sua integração, a cooperação internações e a auto-suficiência das necessidades básicas, pode ser uma oportunidade de complementaridade e subsidiaridade. O aumento de escala permite rendibilizar e racionalizar recursos, mas a sua legitimação depende da forma como reconhecer o primado do cidadão, a importância do cuidar da pessoa vulnerável no respeito pela dignidade da pessoa na definição das prioridades socio-políticas.

Portugal tem dado passos nesse sentido e a experiência da pandemia provocou a rotura de inúmeros bloqueios e anquiloses ancestrais, criando outras tantas oportunidades para melhorar…